A restrição de empréstimos consignados por Instituições Financeiras, quando a soma da idade do cliente com o prazo do contrato for maior que 80 anos não configura discriminação

Através de Ação Civil Pública em face da Caixa Econômica Federal, o Ministério Público Federal requereu, dentre outros pedidos, a condenação da instituição financeira a retirar de seus manuais normativos dispositivo discriminatório que nega a contratação de empréstimos consignados a consumidor, cuja idade somada com o prazo de empréstimo ultrapasse 80 anos. Uma das principais […]

Através de Ação Civil Pública em face da Caixa Econômica Federal, o Ministério Público Federal requereu, dentre outros pedidos, a condenação da instituição financeira a retirar de seus manuais normativos dispositivo discriminatório que nega a contratação de empréstimos consignados a consumidor, cuja idade somada com o prazo de empréstimo ultrapasse 80 anos.

Uma das principais teses de defesa da CEF foi no sentido de que o empréstimo consignado se difere de um mútuo comum, pois sua quitação ocorre por meio de desconto das prestações diretamente da conta corrente do devedor. Além disso, possui caráter irrevogável. Por fim, sua contratação ocorre de forma facilitada e desburocratizada, pois o cliente não precisa ir pessoalmente ao banco para contratá-lo, dada sua disponibilização em vários canais (v.g. internet, guichês eletrônicos) permitindo acesso imediato ao crédito.

Interessante ressaltar também que um dos pontos ventilados pela Instituição Financeira em sua linha de defesa foi o superendividamento da pessoa idosa no cenário atual, baseado em pesquisas empíricas realizadas por Defensorias Públicas estaduais (MG, RS, BA), além de estudos que assinalam a fragilidade a que alguns deles são submetidos diante de pressões familiares para obtenção de empréstimos, com receio de perder afeto ou o apoio de filhos e netos.

Em 21/04/2019, o Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, no REsp 1.783.731 – PR, entendeu que no caso em tela não há que se falar em ato ilícito, discriminatório ou violador do princípio da dignidade da pessoa humana, “mas o reconhecimento de outros fatores justificáveis e razoáveis da limitação ao crédito perante o mercado em geral”. Outrossim, o tribunal também pautou seu entendimento pelo fato de existirem inúmeras outras formas de crédito bancário a serem utilizadas por idosos e apenas a modalidade consignada é que foi objeto de restrição, não colocando o idoso em desvantagem excessiva.

Portanto, não se pode interpretar que tal restrição atente contra a redação do art. 96 do Estatuto do Idoso, que prevê:

 Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade:

        Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

  • 1oNa mesma pena incorre quem desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar pessoa idosa, por qualquer motivo.
  • 2oA pena será aumentada de 1/3 (um terço) se a vítima se encontrar sob os cuidados ou responsabilidade do agente.

Conforme palavras da Ministra Relatora Nancy Andrighi “Somente o comportamento que se reveste desta intencionalidade ilícita será objeto do grave controle normativo criminal.”

STJ. 3ª Turma. REsp 1.783.731-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/04/2019 (Info 647)

 

Vasques Advocacia